quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Livramento um ano depois

Há aproximadamente um ano, publicou-se neste espaço um denúncia, um apelo, um desabafo sobre o descaso das autoridades locais com a minha cidade natal: ttp://pensamentofascinante.blogspot.com/2009/12/faroeste-gaucho.html . E nesse um ano muita coisa mudou, então venho aqui para...desabafar, denunciar, notificar que essa mudança foi para pior.A situação de descaso mudou? Sim, está bem maior.
Ano passado, com a recusa de aumento de salários dos lixeiros por parte da prefeitura municipal, houve a greve daqueles trabalhadores, deixando a olhos vistos a sujeira da cidade. Neste final de ano, o problema é outro, pois o problema é os problemas. Falta de respeito, falta de planejamento, falta de autoridade, falta de concorrência e represálias com os que se opõem à situação de desatenção com a cidade, e cada uma dessas situações incômodas interrelacionam-se, gerando uma grave crise na cidade. 
A companhia de energia elétrica resolve trazer benefícios para cidade, realizando a troca dos postes de iluminação pública. Que maravilha! Não fosse a data, a semana entre Natal e Réveillon. A cidade está cheia de pessoas, a maioria é gente daqui que mora fora, as geladeiras estão cheias também, o calor insuportável, logo ótima data para que fiquemos as tardes inteiras sem energia elétrica, grande planejamento. Muitos podem pensar, não se pode nem desfrutar dessa água gelada deliciosa que escorre pelas torneiras proveniente do aqüífero Guarani. Contudo, aqui o problema é outro, pois também, por algum problema, há um corte no abastecimento de água. Pensei na hora em ligar para alguém para contar esse fato, em publicar esta denúncia na hora do acontecimento, no entanto, a única companhia de telefonia fixa que opera na cidade, aqui o monopólio impera, estava realizando a manutenção das linhas, justamente nessa data, e não havia nem telefone, nem internet. Então, não tínhamos água, luz nem telefone, foi para brincar de século XIX, claro que com o calor que todas tecnologias geraram devido ao impacto da mudança que transforma o clima diariamente. Além de tudo isso, a prefeitura viu-se no direito de subir as tarifas do serviço de água. A boa notícia seria que um vereador mudou seu voto, graças a pressão popular, ao que tudo indica, e votou contra o aumento, dando a vitória à oposição e rejeitando a suba na tarifa. Entretanto, o vereador, logo após o voto, ainda na câmara de vereadores, foi avisado que um veículo do departamento de água e esgoto do município, o DAE, havia dirigido-se à sua casa e cortado o fornecimento de água na casa do político. Uma represália que mostra Livramento cada vez mais próxima ao Faroeste do pampa.
Portanto, diante de tamanho descaso e falta de respeito, parece que não basta às autoridades locais expulsarem os filhos da terra pela falta de perspectivas que a cidade apresenta,haja vista que a população nos últimos 10 anos diminui de 90849 habitantes para 81964 (segundo os dados do IBGE) também parecem não mostrar a mínima vontade que essas pessoas voltem para visitar seus familiares, rever seus amigos e lugares de sua infância e adolescência. "Livramento, ame-a ou deixe-a"! 

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Sombras natalinas


Uma vaga, curiosa e estranha ausência começa nesta época natalina. Não sei ao certo o que é, mas me sinto como se fosse uma sombra, como se todos nós fôssemos sombras. Sim, apenas sombras. Hoje, uma pessoa disse-me que as sombras poderiam representar a essência do ser, mas eu relativizaria tal assertiva, pois acho que as sombras representam justamente a aparência, projeções de nós, variando conforme a angulação solar.

Assim, sinto-me a mim e aos outros também na época de Natal. Neblina, tudo vira neblina, como em um dia ansiosamente aguardado para fazer algo ao sol que amanhece nublado, cinza e frustra nossas expectativas. Bem, em relação ao dia sem sol, até posso entender o motivo da tristeza da apatia que se nos apodera, do tédio que no abate, entretanto, no Natal, não sei qual é o motivo, senão ser Natal. Nunca tive problemas, sempre foi uma data para ser feliz, família reunida, amigos, presentes, comida, festa, contudo, à medida que a data se aproxima, um sentimento negativo, inexplicavelmente, se apodera de mim. Esse sentimento é corroborado por cada criança com fome na rua, por cada pessoa de escassas condições sonhando com um Natal cujo banquete nada mais do que o que temos cotidianamente. Natal é triste, é sem graça, o único bom é ser marca que falta apenas uma semana par o Ano Novo, data na qual as sombras se desfazem. 

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Amanhã começa

Não é muito comum, ou melhor, é, praticamente, inexistente a presença desse tema neste espaço, mas a ansiedade está me dominando, e eis que surge um agente complicador: a impossibilidade de um mesmo corpo ocupar dois lugares ao mesmo tempo.
Amanhã, começa, para o Inter, o Mundial de Clubes da FIFA, e, como muitos sabem, tenho uma doença por esse time, afinal é minha paixão mais antiga, mais antiga ainda que as letras, pois quando aprendi a ler já era colorado. O agente complicador é uma prova final de literatura portuguesa amanhã na hora do jogo. Não deixarei de fazer a prova, porém terei minha capacidade de concentração diminuída consideravelmente.
Bem, a questão é que todo o fanatismo, seja ele qual for, é péssimo, então não me considero um fanático, senão um apaixonado, um romântico em relação ao Campeão de Tudo. Sim, tenho brigas terríveis com ele, fico de mal (as pessoas dizem: "não adianta, você aí furioso e os jogadores ganhando milhões), mas não brigo com jogadores, brigo com o time, os jogadores, assim como nós seres humanos, passam, o amor pelo clube é transcendente, é inexplicável, é egoísta e generoso, é exigente e complacente!
Então, espero que amanhã comece mais um capítulo de uma história terminada com lágrimas de alegria, gritos de explosão, catarse de emoções! Gritemos, vibremos, torçamos! Vamos, Inter!

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Seco

Certa vez, contou-me um amigo uma história sobre um homem seco. Ele me dizia que esse homem fora extremamente emotivo e sensível ao longo de sua vida. Via um cachorro sendo maltratado e abria a torrente de lágrimas; lembrava-se de algo triste, caía aos prantos; algo perturbava-o, chorava de maneira incontrolável. Mas um dia as lágrimas secaram quase que completamente. Uma catástrofe acontecia, e o homem parecia impassível; alguém muito próximo adoecia gravemente, e ele parecia indiferente. 
Contudo, meu amigo disse-me que havia algo de diferente nesse homem, pois ele não permanecia inalterado, senão suas lágrimas haviam secado. Achei a história um pouco estranha e havia me esquecido dela, até que conheci, tempos atrás, esse homem, tornei-me seu amigo íntimo, ele contou-me, então, sua peculiaridade. Não fosse ouvir de sua boca, não acreditaria naquilo. Ele se abalava da mesma forma que dantes com o que de ruim lhe acontecia, sentia toda tristeza e angústia próprias desses momentos, mas não chorava, aliás, segundo ele chorava, mas sem lágrimas e dizia que era pior do que chorar compulsivamente; primeiro, porque não consegui tirar a angústia e a tristeza de si, mantendo-as em seu interior, sem expurgá-las, mantinha-as no seu interior sendo cada vez mais abalado por essas coisas; segundo, porque as pessoas acreditavam que ele era um homem seco, incapaz de sensibilizar-se diante das adversidades. 
Essa é a história do homem que todos achavam que era seco por dentro, e vocês não sabem o que é pior, percebi que ele era mais infeliz que o mais emotivo dos homens. 

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Gostos

Às vezes atribuem à maturidade a característica de ser uma fase na qual nossos gostos mudam. Na verdade, não há transformação, há aceitação. Nossos gostos estavam ali escondidos sob máscaras de aceitação nos grupos, pois a adolescência é uma etapa cujas decisões vêm pautadas pelo selo da tribo à qual pertencemos ou tencionamos pertencer. Claro, há a mudança da vida, que modifica o ser em diversos aspectos, inclusive, nos gostos. Contudo, não estou me referindo a mudança de gosto para algo superior, cujo trabalho com abstrações, incorporações de estruturas novas, mas ao gosto de algo que não aceitávamos anos atrás.
Quando temos quinze anos, somos rebeldes (cada vez menos isso vem acontecendo) e marcamos nossos gostos não só pelo que os demais do grupo exigem, como também pela discordância que temos a priori com os mais velhos; se eles gostam de X, mesmo gostando também, não gostamos de X, e esse é o xis da questão. Aquele gosto fica lá e de tanto ser prescindido acabamos, realmente, desprezando-o, no entanto ele ataca novamente. Mais velhos ou mais maduros, pelo menos, começamos a observar o valor emotivo (e que é o gosto senão um apelo emotivo que agrada ou desagrada?) que ele representa e passamos assumir e a aceitar esses gostos. Para especificar a questão, refiro-me a gostos musicais, literários, estilísticos, enfim uma série de gostos. Uma vez aceitos esses gostos eles se misturam aos forjados e criam a idiossincrasia do sujeito, uma parte de essência, outra construída socialmente. 

domingo, 17 de outubro de 2010

Solidão

O medo de que a única voz ouvida seja o eco da nossa é constante. A solidão é estar em companhia consigo mesmo, e nós somos tão rudes, tão maus, tão egoístas em nosso íntimo a ponto de nos refutarmos.
Estar só é estar acompanhado de tudo que se esconde dos outros, é estar com o eu que não mostramos a ninguém, é estar com nossas angústias, anseios, nossos desejos, nossas buscas, nossas recusas. Estar só é obrigar-se a estar acompanhado do silêncio eloqüente do nosso âmago, é escutar a voz interior contando-nos como somos de fato, o que temos de essência e o que mudou.
Mas, estar só é saber observar erros e acertos, é glorificar-se pelo que nos agrada, é arrepender-se das escolhas (e das renúncias, uma não vem sem a outra), é saber que a nossa existência é extremamente importante para nós apenas. Mas isso é o mais importante, pois somos nós os responsáveis por ela, e é a nos que deve interessar.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Latinidade II

(Continuação)
Contudo, idiossincrasias todos os países latinos têm. Seja na variedade lingüística, na literatura, no Estado, na forma de conduzir a economia, no liberalismo ou conservadorismo do seu povo, seja na visão de mundo própria do país. Apesar de todos esses itens citados, compartilhamos mais semelhanças do que diferenças. A primeira é nos opormos ao Ocidente. Na verdade, não uma oposição, mas uma mágoa por sabermos que não somos parte disso convencionadamente chamado Ocidente no qual temos desejo de intrometermo-nos. Fomos colonizados pelo Ocidente e nos liberamos da servidão por seus filhos criollos que deixaram uma forte chaga de semente no solo latino que até hoje faz florescer caudilhos populistas em estações políticas semelhantes à primavera compartilhadas pelos latinos.
É interessante percebermos essas diferenças e semelhanças, pois elas nos fazem perceber o outro; perceber que não somos únicos e elementos culturais são convenções que se enraízam em nossas mentes. Sim, as fronteiras são a maior ficção inventada pelo homem. Basta retornarmos ao meu local de nascimento para observar que idiomas, países, pessoas e inclusive horários diferentes, em alguns meses do ano, apenas se diferenciam por questões convencionadas. Assim, latinos de duas identidades compartilham suas diferenças produzidas pela cultura sem perceber que somos mais parecidos do que diferentes. Se essa fronteira tangível evidencia tal fato, todas as demais fronteiras latino-americanas podem fazer o mesmo, basta que nos entendamos como produtos dessa mesma cultura. 

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Latinidade I

Nasci em um lugar muito peculiar, mas apenas percebi isso quando me afastei dele, fui a um ponto onde ninguém o conhecia e a curiosidade estava criada. Senti-me dono do segredo, poderoso conhecedor de uma realidade nova para todos e, neste momento, para mim também. A fronteira, meu lugar natal, já é algo ambígua por natureza, no entanto, imaginem quando o local é diferente das outras fronteiras do mundo. Sim, não há águas que a dividam, nem pontes, nem alfândegas, senão as ruas principais de um país acabando nas ruas principais do outro. À medida que as pessoas vão observando as peculiaridades dessa fronteira, o trânsito livre de seus cidadãos, os idiomas diferentes com perfeito entendimento de ambas as partes, vão criando uma curiosidade à Eldorado de um lugar distante.
Meu pai, uruguaio típico, minha mãe, representante da brasilidade encravada em uma língua portuguesa limpa e estudada, comunicam-se perfeitamente, dividem sentimentos e um filho.  Isso aponta uma situação de latinidade. Isso também apenas percebi quando estava distante. Na Argentina, conheci além de argentinos, obviamente, mexicanos, paraguaios, chilenos, peruanos, guatemaltecos e europeus. Observamos, os latinos, que o primeiro requisito de latinidade era negá-la, era dizer que latinos eram os outros. “Uruguaio, você é bem latino”, “não. Latinos são os mexicanos.” “Mexicano, tu és o exemplar do latino-americano!” e ele respondia: “Latinos são os centro americanos”, “Guatemalteco, o estereotipo do latino.” “latinos são os chilenos”, e assim ad infinitum. Os brasileiros nem se menciona como negam essa latinidade, haja vista o idioma que nos afasta e uma série de idiossincrasias.
(Continua)

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Quem sou eu

Há uma lacuna no Orkut, sim no Orkut, que vem me intrigando há bastante tempo. Na página de apresentação do perfil, existe um espaço para ser preenchido: quem sou eu. Mas isso é pergunta que se faça? Não sei quem eu sou. Isso é muito complicado, muito polêmico. Dizer quem eu sou é como conceituar a mágoa, a existência, o amor, enfim tudo cuja carga subjetiva é primordial a sua definição; e não existe nada mais subjetivo que nós mesmos.
Afinal, eu sou o que penso que sou ou que os outros pensam que sou? Serei um desses ou todos esses? Serei um sempre eu ou uma continuidades de eus só perceptíveis pós morte? Nessas definições, há uma heterogeneidade de conceitos, muitas vezes radicalmente opostos, que se vão perpetuando ou remodelando.
E o pathos? Não levamos em conta o que os outros pensam que somos para adequar-nos, se nos agrada, para desmitificarmos o conceito, se não.
Enfim, tudo que posso é entrar na Tabacaria com Fernando Pessoa e concluir que:
                                   Não sou nada.
                                   Nunca serei nada.
                                   Não posso querer ser nada.
                                   À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo. 

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Primavera

Hoje é a entrada da primavera. No Brasil, não damos muita importância a essa data, ao passo que, em países como a Argentina, 21 de setembro é dia de folga para os estudantes, que se reúnem nas praças, fazendo piqueniques. Neste 21, nesta cidade sulina, Santa Maria, a primavera foi recebida com clima outonal, chuva, vento e temperatura abaixo da que já nos acostumáramos. Não, não, não, esta não é uma postagem meteorológica.
Quero, na verdade, retornar à pauta que vem sendo tratada nas últimas postagens do blog, as convenções. O nosso tempo moderno é linear, desloca-se para frente sem que haja repetições ou retornos, já para os gregos o tempo era cíclico. Havia um eterno retorno ao nascimento, simbolizado pela primavera. Assim, o nascimento era a primavera, passando pelo auge no verão, agonizando no outono, morrendo no inverno para renascer na primavera.
Essa noção implica uma perspectiva diferente da que temos. Somos levados a entender a existência, a história e tudo que esta última leva consigo, como uma construção progressiva que nos carrega para o fim. Vemos, no futuro, o fim, o ponto final e não a possibilidade de uma renovação, de que todo o fim é um recomeço embora esse recomeço seja sem nós.
Toda essa fala em catadupas é apenas para dizer que a percepção do tempo muda e com ela a nossa percepção de nós mesmos e da existência. Seja bem-vinda, primavera. Mais um recomeço em nossas vidas.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Convenção

Já conversamos, neste espaço, sobre a pseudo-naturalidade de tudo que nos rodeia, mas, por ser um tema tão rico e tão explorável, retornemos a ele.
Sabemos que atitudes, comportamentos, tendências, posturas são exigências de uma vida em sociedade, contudo assim são em uma determinada sociedade, em um determinado tempo. No século XIX, por exemplo, qualquer ação que escamoteasse a mulher da vida social era natural, hoje, atitudes como essa são consideradas machistas e relegadas a um segundo plano como fonte de barbarismo. A questão é fundamental, no entanto pode levar a um desespero diante da impotência de modificação do status quo. Provocar, argüir, pressionar a realidade através da razão e fazer o mesmo também com esta demanda reflexão, paciência e arrojo, pois a realidade que nos constrói é, por nós, construída. Enfim, não quero resumir a grande aula de Literatura Fantástica, logo passemos a outro tópico.
E, nas relações interpessoais, como se projetam essas convenções? Não pretendo responder a essa questão, senão lançar dados para que construamos essa idéia juntos. Como historicamente acontecem as relações entre pais e filhos, professor e alunos, irmãos, casais, amigos? Não precisamos ser intelectualmente muito agudos para percebermos que elas se modificam ao longo do tempo. Se outrora os pais exerciam uma posição hierárquica cuja contestação de posições, de atitudes, permissões ou proibições era impossível, atualmente, percebemos um diálogo e, infelizmente, em muitos casos, uma atitude de sobreposição dos filhos. Portanto, as relações, a partir desse exemplo, e a forma como elas se dão são convenções sociais por nós construídas que, entretanto, experimentamos, empiricamente, e nos fazem os seres que somos como frutos de uma trajetória de vida.
Então, como podemos pensar nossas angústias, sofrimentos, expectativas e alegrias? Afinal, são sentimentos tão individuais que temos dificuldade de explicá-los em outras línguas quando alguém nos pergunta o que significam. Contudo, são construções sociais também que nos guiam como sentir e o que sentir em cada situação. Conclusão: esta massa é mais homogênea do que parece, mas paradoxalmente, é mais, muito mais heterogênea do que imaginamos, apenas não temos liberdade e, muito provavelmente, nunca a teremos, porque se as convenções nos retiram o particular e nos colocam no centro do geral, alguém as convencionou.

domingo, 29 de agosto de 2010

Distância relativa

Na última postagem, há 2000 anos atrás, falou-se do abraço, a aproximação de dois corpos que pode verter afeto. Tratemos agora de algo oposto, a distância. Como se calcula a distância de afeto? Isto é, podemos estar longe estando próximos; podemos estar colados a quilômetros de lonjura. Tudo depende, na vida tudo depende, de como encararemos os fatos.
Podemos morar na mesma cidade, passarmos o dia em companhia dos amigos, pais, pessoa amada, ou seja, de quem concedemos afeto, mas estarmos anos luz de distância, pois não há afinidade. Não conseguimos fazer a trama necessária para que o afeto seja um entrelaçado de emoções mútuas. O contrário também é verdadeiro. Temos um oceano que nos separa, contudo nos sentimos tão próximos que somos capazes de reduzir a distância a um nada.
Em poucas palavras, hoje estou sintético, se tudo é relativo, é impossível falar em absoluto de algo como distância, porque nós a construímos com nossos assombros e desconfianças, com nossas angústias e fantasmas; no entanto também podemos desfazê-la, mandando tudo isso embora e sentido-nos próximos de coração.

domingo, 8 de agosto de 2010

Abraço

O abraço é tão importante que Eduardo Galeano escreveu um livro a seu respeito, El libro de los abrazos. O abraço conforta e é confortador; o abraço envolve, entrelaça duas pessoas, fazendo que o coração de uma toque no peito da outra; o abraço apertado, que estala as vértebra, transmite calor, carinho, confiança, paz e lágrimas. Um ombro amigo apenas se torna paraíso de ânimo quando se abraça, e se deixam os sentimentos fluírem como rios incertos na sua correnteza.
O abraço pode ser coletivo em comemoração a algo, mas quando ocorre o que fala é uma emoção por outro motivo que não pelo abraço; o abraço precisa de intimidade; um abraço de pai, um abraço de mãe, transmitem, nesse silêncio loquaz, os melhores conselhos possíveis; o abraço da pessoa amada diz eu te amo; o abraço elimina a carência mais que um beijo; o abraço faz as pazes, sela a amizade; mata a saudade, despede e espera o retorno; o abraço falso nem abraço é, pois se afasta logo e não permite se concretizar; o abraço é puro, é ingênuo, é infantil, é verdadeiro, é a queda das máscaras, é o sentimento desarmado de um casca que o esconde muitas vezes; não saberia viver sem um abraço.
O abraço é tão importante que, neste post, o texto abraça a imagem!

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Rotina e Cotidiano

Segundo o Dicionário Aurélio, rotina: seqüência de atos ou procedimentos que se observa pela força do hábito; rotineira. Cotidiano: aquilo que se faz ou ocorre todos os dias. Os dois significados são bastante próximos, assim como a sua diferença, que é quase imperceptível, no entanto, o cotidiano é extremamente aprazível, enquanto a rotina é cansativa e digna de rejeição.
Estabelecer ações que se repetem e dão ritmo à vida, deixar que a vida imponha suas necessidades, apresentando-nos tarefas a serem realizadas habitualmente, é importante, é, digamos até, necessário para quem pretende algo de interessante em sua vida. É do cotidiano dormir, acordar, comer, estudar, trabalhar, divertir-se, conhecer pessoas, afastar-se de pessoas, criar expectativas, perder as esperanças, apaixonar-se, desiludir-se, mudar. Sim, mudar faz parte do cotidiano; cada dia a cada minuto que passa somos outro, com um minuto a mais de vida, com algo diferente, com um aprendizado, com uma sensação, com uma passagem do tempo ao menos. Já a rotina machuca, pois é a impossibilidade de um acontecimento novo. É algo que pesa, porque se faz sentir desagradável. Algo que antes era prazeroso, uma novidade que, ao passar do tempo, torna-se hábito pode ser cotidiana quando temos a possibilidade de fugirmos dela, agora quando se enraíza e não nos deixa escapatória faz-se rotina. A rotina é a própria desilusão com a seqüência repetida dos fatos; pode ser encarada como o cotidiano sem fuga, sem flexibilidade, rígido e inexorável. Ou seja, a rotina é o que pela sua repetição dilacera. É uma ferida aberta e remoída, impedindo sua cicatrização, diária. Do mais banal ao mais necessário, a rotina é aquela sensação de não querer mais aquilo, contudo ser impelido ao indesejado. As ações cotidianas regram a vida, colocam horários, métodos e et ceteras; a rotina é quando essas regras querem ser quebradas, porém não se pode burlá-las.
Para quem chegou até aqui no texto e não concordou tudo bem, pois para mim isso é cotidiano. Se discordou de cada um dos conceitos, sem problemas, pois isto é uma negociação de sentidos e podem ser invertidos para quem crê que cotidiano é o descrito como rotina e vice-versa. Agora, fica um pedido, tornem a leitura algo do cotidiano, sem virar rotina.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Negociação de sentidos

Ninguém é dono dos sentidos que produz. Então, sabemos que uma frase, um texto, uma obra de arte é uma constante negociação entre locutores e interlocutores. As palavras vêm permeadas de significações subjetivas que impossibilitam sua expressão total, logo elas nunca alcançam a completude.
Dessa forma, a comunicação sempre depende de algo mais, de uma negociação de sentidos, de uma projeção de imagens. Então, chegamos a um ponto interessante para desmitificar uma prática recorrente entre “críticos” de literatura, “professores” de literatura e o senso comum, influenciado pelos dois primeiros. Essa prática diz respeito à clássica pergunta “o que o autor quis dizer?”. Bem, para responder a essa questão, necessitaríamos de uma conversa com o autor, precisaríamos que ele estivesse vivo e se lembrasse, exatamente, do que quis dizer.
Portanto, passemos a outras formulações, tais quais os sentidos que estão postos na obra e podem ser encontrados e justificados. Quem faz isso são os críticos de literatura e os professores de literatura, contudo, infelizmente, esses profissionais estão em menor número do que os “críticos” e os “professores”. Retomando: os sentidos produzidos por um autor em determinada obra vêm permeados de outras significações que, muitas vezes, passam despercebidas pelo artista e dão margem para que o interlocutor perceba-as, aproprie-se delas e crie a sua própria leitura. Essa leitura se bem justificada passa a ser mais uma leitura tão perspicaz quanto a do autor.
Assim, uma obra que permite muitas possibilidades de leituras acaba por tornar-se um clássico, sem que uma interpretação de sentidos exclua a outra. Nessa senda, as aberturas de interpretação permitem que se busquem os sentidos mais recônditos sem esgotá-los, lembrando-se sempre que isso tudo, para ter valor, precisa ser extremamente bem justificado, abrindo possibilidades para várias abordagens da obra de arte. Portanto, a negociação de sentidos não termina nunca mesmo que não exista mais o outro negociante.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Orvalho

Os raios de sol derretem a geada, transformando-a em orvalho novamente. A vida toda ao reverso. Os fachos de luz atravessam pelo meio das folhas das árvores e aquecem apensa onde tocam. O frio permanece ao redor. Abro a janela, vejo concreto e frio. Sim, é possível ver o frio. Ele está a nossa frente, na paisagem. A fumaça do solo do orvalho, que evapora, é nuvem. São imensas nuvens brancas na terra. O frio mata, mas também embeleza.
Permito-me um atraso nas minhas obrigações para observar o frio. Os pássaros encolhidos, as pessoas a levantarem-se de suas camas, os que as têm, também encolhidas. Alargo-me, a paisagem do frio inunda nossa noção de estética e me faz sentir bem, com frio, mas bem. O sol sobe um pouco mais, a fumaça aumente, o tempo passa. Agora a árvore tapa um pouco mais o sol, a fumaça estanca, o tempo pára. Poderia haver parado naquele instante, não deveria mais correr o ponteiro do relógio, para o mundo tornar-se fachos de luz entre as árvores, orvalho, fumaça e frio.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Paradigmas internos

Seja o yin-yang na tradição oriental, seja a dualidade percebida por Deus depois do Dilúvio, o bem e o mal existem em nós, ou melhor, o bom e ruim. Então, está dentro, bondade, maldade, ciúme, confiança, raiva, tolerância, flexibilidade, rigidez. Contudo, geralmente, predominam alguns elementos desses pares, fazendo com que os outros se apaguem ou, ao menos, sejam obliterados. Portanto, somos tudo e nada concomitantemente, somos o que deixamos vir à tona e somos o que escondemos, mas existe.
Conhecem-nos ou, reconhecem-nos como sendo aquilo que mostramos, que evidenciamos. Nós nos conhecemos como aquilo que queremos mostrar. Esses dois pontos de vista não são idênticos, havendo, assim, um problema de identidade do sujeito. No afã de mostrar que somos bons, ou agradáveis, ou a projeção que o outro faz de nós, esquecemo-nos de ser quem somos, de conviver com os elementos das dicotomias que mais nos aprazem, tornando-nos diferentes de nós mesmos.
Neste ponto, crescem os problemas porque ao deixarmos de mostrar-nos como antes nos mostrávamos, criamos um novo paradigma de escolha dos elementos das dicotomias e convivemos com uma nova postura, convivendo, destarte, com um ser novo para nós. Isso também causa o desconforto de quem convive conosco e conhecia um sujeito distinto deste que se apresenta. O desconforto dos outros em relação a nós, e nosso próprio desconforto faz-nos perceber o quão desagradável é conviver com o que não queremos, tornando-nos insuportáveis a nós mesmos.
Pode-se imaginar, neste momento, que este texto é conservador, contrário às mudanças, contudo, creio que é exatamente o contrário. Sim, aceitar as mudanças dos outros. Aceitar que temos certo tipo de atitudes que poderiam ser diferentes e mudá-las, sim. Porém, a mudança sempre deve vir para que a possamos experimentar em direção à satisfação, isto é, a mudança é boa quando nos faz sentir melhor. Então, essa troca deve ir ao encontro dos elementos das dicotomias e não estabelecer um novo paradigma interno, pois somente os paradigmas externos devem ser rompidos. Se os internos se rompem, perdemos aquilo que comumente chamamos essência!

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Muito natural, não?

Certas coisas são naturais do ser humano, como por exemplo, quando temos necessidades fisiológicas, vamos ao banheiro e pronto, isso é natural. Será? Ponderemos. Se estamos em outro país de cultura ocidental, já encontramos diferenças que desnaturalizam certos conceitos. Para seguir pensando sobre isso deveríamos definir cultura. Esse passo é mais complexo, mas tentemos. Escolhemos o conceito de Williams, o qual trata a cultura como, grosso modo, um sistema significante através do qual uma ordem social pode comunicar-se e investigar-se.
Sigamos pensando em conceitos ações consideradas naturais. Quando mencionamos visitar um país de cultura ocidental, ignoramos que, dentro de um país, subsistem diversas culturas. Tomemos o Brasil como referência. Em nosso país, existem comunidades indígenas autóctones, logo não são menos brasileiros do que nós, mas vivem sob outros paradigmas culturais que não ocidentais. Assim, se em uma tribo (isto é extremamente hipotético) o ato de defecar é coletivo, os membros dessa comunidade não se estranhariam de um sujeito defecando à vontade na frente de todos. Isso pode chocar, no entanto aponta para que até os atos julgados mais naturais não o são. São, na verdade, construções culturais arraigadas a nós graças a uma forte tradição e perpetuação de uma hegemonia que não se deixa bater.
Mudemos o enfoque. Instaurados em uma cultura não ocidental, do outro lado do mundo, tudo nos parece bárbaro, sem percebermos que estamos, ainda, com uma ideologia próxima a dos romanos, que rejeitavam tudo o não originado, adaptado, integrado ao Lácio como bárbaro, pior, terrível. Vemos com assombro a entrega religiosa e fanática de muçulmanos, horrorizamo-nos com a sociedade estamental indiana toda baseada nas castas. No entanto, apagamos da memória o que foi o Feudalismo, as Cruzadas; ignoramos o fanatismo em Cristo que leva ao auto-flagelo, ao desprezo dos diferentes ou dos que nos desprezam, pois o que vale, o que é natural e, portanto, correto é a nossa perspectiva, é a nossa cultura.
Isso não é mero desprezo da alteridade, porque vai muito mais além. Ao entender como natural a língua, as roupas, as atitudes mais triviais, rechaçamos que tudo, ou 99,9% de tudo, é construção social. Obviamente, é fácil esquecer-se disso, afinal nascemos e já temos uma cultura (im) posta, à qual devemos adequar-nos. Entretanto, ao pensarmos sobre essas questões e tentarmos desnaturalizar conceitos - isto não que dizer que não deve haver atitudes automáticas, pois, sim, devemos adequar-nos ao meio, embora devamos e possamos criticá-lo – veremos como é possível respeitar o outro, como também contestar e posicionar-nos frente à dura realidade vivida.
E, para deixar mais um objeto de reflexão, pensemos no mundo natural. Há pouca coisa natural ali, pois tudo que se planta é um cultivo, logo uma cultura... Sobra quase nada!

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Adeus, Saramago. Até logo, Saramago

Não gostaria que este espaço se tornasse algo parecido com as famílias grandes e sem contato cujos encontros acontecem à beira de um caixão em uma sala de velórios, contudo não se pode eximir a necessidade que, mesmo sem tempo graças à síndrome de fim de semestre, algumas palavras fossem escritas para o grande Saramago.
A consternação dos amantes da literatura, escritores e comunistas é enorme. José Saramago representava os três em um só. O nosso único Nobel em língua portuguesa se foi hoje, tolhendo-nos a expectativa por seus próximos, bem construídos, argutos, irônicos, bem humorados, sem deixar de denunciar, simbolizar e retratar as mazelas humanas, livros.
Principalmente, as narrativas de José Saramago mesclam algo que é raríssimo hoje em dia: boa literatura e boa leitura. Conseguiu o escritor português criar uma literatura de excelente qualidade, com tramas narrativas extremamente bem amarradas, cujo prazer da leitura estava presente. Seus temas fantásticos ou com inversões do que a história nos conta deliciaram a todos os que o leram.
Resta dar adeus ao escritor eterno em seus livros, mas materialmente morto e acabado, pois, ateu como era, ateu como sou, acreditamos que, morta a matéria, não resta nada. No entanto, facilmente encontrável em seus livros abertos a todas as penetrações possíveis. Reencontrá-lo-emos em suas páginas. Então, fiquemos com algumas palavras suas de “A Jangada de Pedra”:
“Da noite para o dia a Europa apareceu coberta de inscrições. Aquilo que ao princípio talvez não tivesse passado de um mero e impotente desabafo de sonhador, foi alastrando-se até tornar-se grito, protesto, manifestação de rua.”

domingo, 23 de maio de 2010

Abismo

Jogar-se no abismo sem medo de que o machucado seja o passo posterior à vida é, sem dúvida, viver. Enfrentar os nossos medos e as nossas angústias, sabendo os riscos que corremos, faz com que vivamos. Diz-se, muito freqüentemente, neste espaço, que a vida é feita de escolhas e somos os seus resultados, então escolher entre não correr risco e também não viver tudo o que esses riscos podem nos proporcionar e corrê-los sem sermos, também, temerários, fico com o segundo.
O tão citado neste blog, Fernando Pessoa, já disse “navegar é preciso, viver não é preciso”. A vida não é matemática, não tem tudo em seu lugar para se chegar a um resultado exato, senão história, filosofia, literatura. É imprevisível e cheia de nuanças, mistérios, dores e alegrias. Agora não podemos pensar que a vida é fácil. Toda dor é um prelúdio da alegria e vice-versa, pois felicidade e tristeza são momentos, e a distância entre uma e outra dá o tom de cada uma delas.
Arriscar-se a sofrer, no futuro, é gozar o presente, é saber que os medos e angústias estão em estado latente, mas aí devem ficar. Ser precavido em demasia é empecilho à vida, ao prazer, à felicidade. Obviamente, que arriscar-se sem limites vai gerar sofrimento também, porque perdemos as rédeas da situação. Talvez, o ideal não seja o meio-termo, mas um pequeno pendor na balança para o lado da temeridade. Assim sofrer por ter-se arriscado é sofrer por tentar viver, e não por deixar a vida passar pela nossa frente. Então, pulemos do abismo!

terça-feira, 11 de maio de 2010

Gotas

Não entendo as gotas. Obviamente, há tipos distintos delas: umas pingam, outras caem. As que pingam são de menor grandeza e sedução, pois fazem seu caminho pelos canos. As que caem são lindas, únicas, individuais, mas, ao tocar o solo, unem-se, formando um todo indivisível cuja função é rolar, descer, unir-se ainda mais.
As gotas escorrem, limpam as ruas da sujeira superficial, arrastando-a consigo, depositam-na em locais inapropriados e fazem crescer a superfície de água. Outras gotas ficam penduradas nas árvores, nas janelas, nas marquises e vão se soltando devagar, alongando-se, ficando presas por tênues espelhos líquidos quase imperceptíveis.
A melhor sensação é das gotas que vêm com tremenda força e, no momento do choque com o asfalto, geram mais uma quantidade considerável de gotas, cujo sentido é contrário das que descem, e logo após acabam tocando o solo novamente e aliando-se a todo aquele conjunto de gotas sem identidade específica, observadas como, simplesmente, água.
A chuva nada mais é do que um fenômeno climático, mas as gotas têm vida própria. São individuais até o momento de serem cooptadas pela imensidão delas, tornando-se um líquido uno, assim como a multidão das pessoas nas cidades: sem identidade, sem vontade, sem porquê, apenas, sendo!

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Crise

Não sei como funciona este ciclo: se nossa apatia e falta de conhecimento gera este lixo cultural ou se, ao nos empurrarem esse lixo cultural, fazem-nos seres apáticos e sem conhecimento. Refiro-me, especificamente, não à crise das humanidades, mas à inércia cultural dos alunos de cursos das humanas no Brasil.
Entramos no curso, buscamos nosso diploma e não fazemos nada, nem, ao menos, olhamos para o lado a fim de saber o que acontece ao nosso redor. Saímos muito pior do que entramos, pois somos formados em algo para que não temos proficiência. A partir disso, cria-se um ciclo mais terrível ainda. Não temos proficiência, mas somos formadores de opinião. Formaremos pessoas menos capacitadas que sairão menos proficientes que nós e formarão pessoas menos capacitadas ainda e assim ad infinitum.
Há o problema de, muitos anos atrás, haver-se popularizado o ensino médio sem o investimento necessário na base. Esses alunos (nós) mal formados entraram na faculdade, pois esta se está popularizando, como aconteceu com o médio no passado, sem a menor condição de encará-la. Fato que, muito em breve, estender-se-á aos programas de pós-graduação, ou seja, estamos perdidos.
Obviamente, que o parágrafo anterior não aborda nenhum estudo sociológico e também não pretende dar conta da totalidade do fracasso dos alunos dos cursos das humanas, pois nem se falou na pós-modernidade, no estado atual de nossa sociedade que não permite a “perda de tempo” com reflexões nem com o conhecimento da tradição. Porém, devemos nos lembrar que a exigência de um diploma e a relativa facilidade de ingresso nas carreiras das humanas fazem-nas alvo fácil de caçadores de canudos cuja aptidão está a quilômetros desses cursos.
Se não nos acordarmos, seguiremos descendo o poço, e o que a arte, a filosofia e a história mostraram de nossa época será a representação de homens máquina, ou melhor, de homens virtuais. Seres movidos a comandos e cliques de mouses sem, sequer, pensarem o porquê de fazerem o que fazem.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Escolhas!

Em certos momentos, decisões são mais complicadas que nunca. As escolhas, ou seja, a vida, são muito simples quando relativas a problemas sem maior amplitude. Contudo, sempre que a dificuldade é enorme, a escolha é impraticável (obviamente, que impraticável é um grande exagero, mas é quase), pois sabemos que cada escolha é uma renúncia, logo sempre estaremos perdendo algo sem saber o que é.
Assim, perdemos algo sempre que ganhamos algo. O ganhado vivemo-lo, o perdido desconhecemo-lo. Porém, a vida funciona dessa forma o tempo todo, porque apenas apreendemos o vivido, o experimentado, o que é desconhecido não nos faz falta. Quando criança, viajando para capital do estado, lembro-me de passar uma cidade muito pequena, na qual outras crianças brincavam. Pus-me a pensar o quão infelizes eram as crianças por viverem naquela cidade tão pequena e triste. Ledo engano. Anos depois, dei-me conta de que para aquelas crianças, aquele era seu universo, sem haver outras possibilidades.
Enfim, essas são escolhas mais abstratas, que perpassam um viés filosófico-existencial. No entanto, há escolhas relacionadas ao mundo prático cuja preocupação deveria afligir-nos tanto quanto qualquer outra emocional ou intelectual. Este ano, no Brasil, é ano de eleições, portanto, tomaremos uma decisão, faremos uma escolha, para os próximos quatro anos. À diferença das escolhas abstratas, nas quais se unem razão e emoção, nesta o que deve pesar é, sobretudo, a razão. Devemos votar sem paixões, que não sejam o desejo de honestidade e respeito. Isto é, basear nossas escolhas em fatos, e não ficar a pensar que não gosto deste porque sim, ou prefiro o outro porque é mais charmoso e galante. Votemos pensando, comparando, conhecendo passado para projetar o futuro. Ou seja, levemos mais a sério essa escolha, pois ela determinará muitas coisas em nossa vida, inclusive, na parte emocional.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Viver melhor

O outro dia, foi feita, neste espaço, uma pergunta bastante pertinente, o que se entendia por viver melhor. Cremos de tamanha importância tentar respondê-la, embora saibamos a impossibilidade desse fato, haja vista ser este blog o lugar da prolixidade inócua.
Talvez, viver melhor seja buscar a felicidade, fazer as escolhas que a ela conduzam, tentar diminuir ao máximo tudo de desagradável que dela nos afaste. Isso pode parecer de um egoísmo avassalador, mas, sem deixar de sê-lo, não o é completamente. Isto é, uma afirmação daquelas pode parecer, a olhos incautos, realizar, apenas, asa ações que conduzam a felicidade, o viver melhor, renegando tudo aquilo que causa tristeza, frustração, infelicidade. Contudo, a vida não funciona assim. Se traçamos um objetivo, seja ele qual for, inclusive, não se ter objetivos, o mais difícil de todos, passaremos por obstáculos, angústias, desrealizações, passos atrás pra lograrmos o fato desejado causador de felicidade, logo o caminho não é fácil.
Se levamos uma vida de instantes, sem planos futuros, sem muitas expectativas, o viver melhor, um tanto quanto estóico, é fazer o que se deseja e rejeitar, sim, tudo aquilo que nos desagrade. Porém, viver em sociedade é também aceitar o desagradável, conviver com a diferença, readaptar-se continuamente, pois, raramente, somos felizes na solidão absoluta, até porque se assim o fosse, não necessitaríamos de nada, além de nós mesmos, para sermos felizes. A mera convivência de nós com nós mesmos far-nos-ia os seres que melhor vivem a vida.
Em suma, o viver melhor, como tudo na vida, passa por escolhas e não por resultados apenas. Aliás, estes estão atrelados àquelas. Fazer ou não fazer algo desagradável para depois ou, até, surpreendentemente, no momento, termos um instante de alegria é escolha e far-nos-á felizes ou não por alguns momentos, porque a felicidade é momentânea e nunca perdurável. Entretanto, isso não nos fará melhores ou piores depois da obra completa, isto é, no além-túmulo, seremos seres que viveram e morreram igual a todos que por aqui passaram ou passarão. Então, como a vida é assaz curta, o mais interessante seria aproveitá-la ao máximo, pois não teremos como nos arrepender depois, e nunca privar-se do que nos traz felicidade apenas porque isso nos é imposto.

quarta-feira, 31 de março de 2010

Qual a diferença?

Em uma aula de latim, conversávamos sobre a Fíbula de Preneste, uma fivela cujo valor é de ser o primeiro documento escrito em língua latina, na qual estava escrito “Manius me fecit Numerio” e que Manius nunca imaginaria que seria responsável pela primeira escrita conhecida em latim, a qual é de, aproximadamente, 600 a.C. Feita essa introdução, seria interessante abordar o tema da postagem de hoje: que diferença fez isso na vida de Manius? Viveu como um trabalhador e morreu, como acontecerá a todos que ainda existimos. Talvez, tenha sofrido, talvez, tenha sido infeliz, talvez, não.
A questão é que Cristo é conhecido por todos como um homem maravilhosamente bom (alguns acreditam ter sido Jesus mais que um homem, um semi-deus, com poderes divinos); Hitler é conhecido por todos como um homem terrivelmente mau (alguns acreditam não haver acontecido o holocausto e por isso Adolf não seria tão mau); Ricardo, o entregador de jornais na década de 50, é conhecido por alguns como um homem normal (alguns acreditam ser ele uma pessoa boa, outros pensam, exatamente, o contrário). Enfim, temos três personagens, mas poderiam ser os bilhões de pessoas que já habitaram a Terra.
A partir deles, perguntemo-nos: o que os faz, ou fê-los, diferentes em vida, isto é, para vida deles? Quem afirma que um deles foi mais feliz que o outro? Que alguns viveram sem angústias e os outros na agonia? Que uns sofreram mais que os outros? Ninguém poderá fazer tal afirmação, pois ninguém o saberá. O reconhecimento póstumo não muda a viva vivida de ninguém, o conhecimento em vida traz alegria por uns momentos, contudo não muda, drasticamente, a existência do ser. A transcendência, através das ações ou das letras, não nos faz melhor ou piores. Talvez, o esforço, para conseguir viver feito por Ricardo, tenha sido muito maior que o de Cristo, e Ricardo não tem uma linha nos livros de História.
Portanto, o ponto crucial da existência, quiçá, seja não se preocupar com a transcendência, senão existir vivendo, fazendo o que se gosta, pensando no presente, evitando desgastes desnecessários, veja bem, não se menciona falta de esforço para conseguir o que se quer, mas fazer de tudo para conseguir o que se quer; e se o desejado é atingir a transcendência, que se lute por ela, porém não nos enganemos, isto não nos fará melhores nem piores, afinal todos acabaremos da mesma forma: acabando.

segunda-feira, 22 de março de 2010

De onde vem?

O que desperta um sentimento? O que faz outro adormecer? Sobrepõem-se uns aos outros em estado latente à mercê do acaso ou desaparecem e tornam a aparecer às vezes? Como sempre, respostas não são fáceis de serem dadas em qualquer campo da existência humana. Contudo, discorrer e refletir sobre fatos, pois sentir também é um fato, faz-nos construirmos uma idéia melhor sobre eles.
Os sentimentos são, ao que parece, uma bomba prestes a ser detonada, esperando uma fagulha para acender-se. Algo os desperta, algo os faz adormecer. Talvez, sejam como a visão. Quem não tem problemas visuais pode enxergar. Isso parece ser de uma redundância horripilante, mas relativizemos. Sem a luz, podemos ter a capacidade de ver, no entanto não o conseguiremos, pois temos a necessidade desse conjunto de fatores para usufruirmos o dom da visão. Assim, cremos, são os sentimentos. Necessitam de algo para desencadear-se em uma sucessão infindável de sensações. Observemos que, mais uma vez, falamos dos sentimentos, porém não pretendemos explicá-los, haja vista o mestre Sartre haver apenas escrito um esboço sobre eles, que maturidade temos para ir mais além?
A questão é a sobreposição de um ao outro. Não deixamos de estar felizes porque estamos tristes, senão a tristeza foi mais forte e empurrou a felicidade para o fundo poço do coração ou vice-versa. O primeiro problema dos sentimentos e sua sobreposição é o fato de serem arredios, impertinentes e controversos. Destarte, aparecem sem serem convidados, recusam-se a sair e contradizem-se o tempo todo. Entretanto, não os vejamos, simplesmente, como negativos, porque quando chegam e fazem-nos sentir bem, são as visitas inesperadas e agradáveis que queríamos há muito tempo. O segundo problema dos sentimentos é o que carregam consigo, isto é, um punhado enorme de sensações. Difícil explicar a diferença, contudo, tentemos. Os sentimentos seriam um gênero do qual fazem parte sensações que não têm fronteira fixa, podendo migrar de um ao outro. A ira desperta a raiva, o rancor, a sensação de impotência, de vingança de menosprezo. O amor, a de felicidade, de ansiedade, de desejo, de... tudo. Bem, talvez, as sensações não sejam um problema, senão uma necessidade dos sentimentos.
Enfim, não se conseguiu explicar nada, o que é comum neste espaço. Contudo, logrou-se pensar sobre os sentimentos e perceber que sempre estamos sentindo através das sensações, afinal estamos vivendo, e viver é sentir. Se soubéssemos o que desperta um sentimento e faz outro adormecer, poderíamos controlá-los, mas então a existência seria bem menos confiável e prazerosa ou dolorida. Sim, dolorida, pois a dor faz-nos viver, andar para frente, querer livrar-nos dela, mas para quem goza da felicidade, aproveitemo-la, embora sem saber de onde vem.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Prova do tempo

Conhecemo-nos, se tivermos afinidades nos aproximamos e criamos o laço mais forte e importante que há no mundo, a amizade. Quando somos amigos, convivemos, trocamos experiências, compartilhamos sucessos e desventuras, damos apoio e somos apoiados; queremos saber tudo a respeito da pessoa e ela de nós. Contudo, quando há uma amizade que, de forma natural, esvai-se, a amizade termina? Se ficarmos dez anos sem falar, ver ou ouvir a pessoa, não somos mais amigos? Sempre acreditei que sim, porém, nestes últimos dias, foi-me possível perceber que isso era um ledo engano.

A amizade, quando a há, fica em estado latente, pulsante entre os amigos. Afastamo-nos das pessoas pois somos como os planetas, ou como diria Fernando Pessoa “ Satélites da tua subjectividade objectiva”, e giramos, orbitamos em torno de nós, mas um dia aproximamo-nos novamente e descobrimos que nada mudou, apesar de tudo ter mudado. Descobrimos que a amizade, até então em estado de suspensão, desce e reencontra-nos mudados, sendo os mesmos em essência. Obviamente, que com essas mudanças de pensamentos, idéias, posições que nos fazem os mesmos diferentes, uma amizade pode não se tornar, novamente, sólida e aí que vemos a pureza, a sinceridade e capacidade de ser quem somos, agindo tal qual devemos. Pois se amizade voltou da mesma forma ou com mais intensidade, podemos dizer que a falsidade está longe, e nossos amigos são seres confiáveis. Logo a amizade passou pela prova mor, a do tempo!

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Férias

As férias estão intensas e estão a ser as melhores dos últimos anos. Os livros são ótimos, a leitura é algo que apraz, a escrita algo que purga e o estudo algo que nos faz crescer. No entanto, é essencial experimentar a vida, conhecer pessoas e lugares, passar um bom tempo com os amigos e pensar na vida. Isso tudo se torna melhor quando o fazemos diante do mar.
Para quem gosta da praia, do sol, do sal e, porque não, das noites, a praia é algo incrível. Então, como estive por algum tempo nela e a ela retorno amanhã, peço desculpas pela falta de atualização do blog, mas viver é preciso.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Ressaltando

É importante ressaltar a existência de certas categorias literárias, embora, neste espaço, não haja a pretensão de literariedade. Há muito tempo, deixou-se de encarar, na narrativa, o enunciador como sendo o sujeito empírico do autor, ou, na poesia, o enunciador como sendo o poeta de carne e osso. Outro fato importante ressaltarmos é a forma com a qual se procede na escritura deste espaço.
Há categorias que norteiam os estudos literários desde, aproximadamente, a metade do século XX. Não se trata o enunciador, a “voz”, presente na obra como sendo a voz real do autor enquanto sujeito existente no mundo dos objetos, isto é, delinearam-se instâncias narrativas, pois literatura é ficção, é literatura mesmo, antes de tudo. Então, quando se trabalha uma obra não se menciona o nome do autor como sendo a pessoa que diz tal ou tal coisas no texto. Essa instância é conhecida pelo nome de narrador. É o narrador do texto que pontua, observa e carrega os leitores (também uma instância discursiva) ao longo da obra, assim como, de forma semelhante, na poesia, a categoria é de sujeito poético. Essas categorias se tornaram mais complexas e nos deparamos atualmente com o autor-implícito, na narrativa, e com o sujeito lírico, na poesia. Estas últimas instâncias são as responsáveis por atar o texto, por tecê-lo. O autor-implícito dá direito a fala aos personagens, ao narrador, decide quanto cada um vai falar, se a frase vai ser entrecortada ou centopéica, enfim, é o responsável pelas escolhas dentro da obra. Na poesia, essas escolhas são feitas pelo sujeito lírico. Portanto, não se deve confundir autor, poeta com o enunciador da obra, pois o autor pode pensar exatamente o contrário do que escreve.
Em relação à forma de ação do enunciador deste espaço já se disse em outras postagens que o sentimento, apenas, pode ser sentido no momento em que se sente. Não se pode sistematizar qualquer sentimento enquanto estamos tomados por ele. O sentimento, somente, vira discurso quando já não é sentido ou, ao menos, não é sentido de maneira assaz avassaladora. Assim, sempre quando nos reportamos a tal assunto referente aos sentimentos, eles já são passados ou não são mais sentidos em sua plenitude.
É interessante fazer esse esclarecimento porque este espaço não é espelho de uma vida para refletir momentos, embora, de alguma forma, eles possam ser captados, pois todos escrevem algo em um determinado momento e por algum motivo. As idéias aqui expostas concordam, pelo menos, no momento de sua escritura com as do autor deste espaço, embora possam mudar muito rapidamente. Isso não significa que seja o vivenciado pelo sujeito empírico no momento da escritura, principalmente, quando o tema são sentimentos.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Inadaptação

Quando não nos contentamos com algo, buscamos readaptar-nos. Quando não nos adaptamos com alguém, procuramos modificar-nos, modificar a outra pessoa ou, simplesmente, afastar-nos. Contudo, que devemos fazer quando não nos adaptamos com nós mesmos? Aí reside uma grande dificuldade: o problema de convivência que temos conosco.
Algo se modifica em nós às vezes, seja uma situação, seja um modo de perceber o mundo que nos rodeia ou a forma de perceber-nos. Com algo modificado, temos a sensação de que estamos inadaptados ao nosso corpo, ao nosso convívio, à nossa existência. Podemos não nos contentar conosco ou, pelo contrário, contentar-nos em demasia, que esses extremos nos fazem sentir, quer plenos, quer vazios, estranhos a nós. Isso nos obriga a repensarmos a nossa vida, os nossos comportamentos, enfim, em repensar-nos.
A “auto-inadaptação” é a mais complicada de todas as inadaptações porque a única salvação, após um longo tempo de angústia, é a nossa modificação como fruto de muita reflexão. Parece paradoxal pensarmos em inadaptação à nós, pois somos obrigados a conviver conosco as vinte e quatro horas do dia, daí temos de encontrar a solução o quanto antes possível.
Repensada a nossa existência, novamente adaptados à nós, seremos outros e com novas possibilidades de inadaptação. Sempre é assim. A vida é cíclica. Temos problemas, resolvemo-los, para depois termos outros problemas para serem resolvidos e nunca chegamos a uma síntese nessa pseudo-dialética. Somos alvo de nossas angústias, suportamos todos os elogios e mal tratos, todas as ansiedade e felicidades, sempre moldando-nos, parcialmente ao menos, às circunstâncias impostas pela existência.
Portanto, a dura convivência com momentos freqüentes de oscilações interiores é a vida. A vida é constante readaptar-se, repensar-se, reviver-se. Tudo está interligado. Todas as adaptações e inadaptações criam um circuito, no qual uma estabiliza ou desestabiliza a outra. Readapto-me, logo existo.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Ira

Sempre que falamos sobre algum sentimento, neste espaço, abordamo-lo de forma mais ou menos racional. Pensamos depois de havermos sentido porque, talvez, seja esta a característica essencial dos sentimentos em geral: serem, apenas, sentidos, embora depois possamos pensá-lo, sistematiza-lo, enfim, torna-lo algo menos abstrato.
O sentimento escolhido esta vez é a ira. Oh! Sentimento terrível, quiçá com grau de hierarquia superior aos outros, mas, como todos, aparece sem que lhe convidemos, abanca-se, controla-nos e depois se vai como se não tivesse vindo, deixando-nos quase igual a como éramos antes de seu aparecimento. Quase igual, pois não seremos os mesmo, ou seremos os mesmo, no entanto com um sentimento experimentado a mais.
Assim é a ira, junto com a gula* e com a avareza são os sentimentos eleitos como pecados. Afinal vaidade, luxúria, etc. são comportamentos movidos por um sentimento, mas não sentimentos em si. Curioso a ira ser um pecado, porque sem ela seríamos seres por demais reprimidos, talvez o pecado aí seja a falta de autocontrole. A ira é necessária, descarrega-nos do que de ruim há em nós. Todos a sentimos, a única diferença é a forma como a exteriorizamos.
Atualmente, o mundo vive em torno da indústria processual, assim a ira é reprimida e uma ofensa é julgada nos tribunais. É lindo! Somos os reis da civilização. Chegamos a um ponto que nos livramos de toda a selvageria contida em nós. Em compensação, convém lembrar que também somos fábrica de assassinos em série, de psicopatas, de sociopatas e mais uma enorme gama de sujeitos que reprimiram a sua ira ao longo da vida e, em algum momento, exteriorizá-la-ão.
Dessa forma, o que fazemos é travar lutas contínuas contra a ira ao invés de liberá-la, ao menos, parcialmente, porque é óbvio que não poderemos despejá-la sempre que a sintamos, e isso vale para qualquer sentimento. Nunca nos mostramos por completo quer no amor, quer na angústia, quer na ira. Embora deixá-la aparecer com parcimônia é extremamente benéfico.
Portanto, gritemos, xinguemos, batamos um pouco, pois o esconder a ira sempre que ela aparece é condenarmo-nos a sermos infelizes, a sermos reprimidos. Deixemos de apelar a terceiros para descontar nossa ira. Resolvamos as coisas com um pouco de selvageria, pois nossa essência é selvagem. Isto que somos? Seres civilizados, isto é, seres reprimidos.
* Retire-se a gula entre os sentimentos/pecados, pois, como sagazmente afirmou Ro, ela é um comportamento movido pela ansiedade, insegurança, etc.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Um ano

Há, exatamente, um ano iniciava este espaço com a apresentação do autor. O que fizemos, neste ano, foi uma continuação da apresentação. Na primeira postagem, havia a formalização da estréia (um ano passado e sigo sem desvencilhar-me desse acento), de quem era a pessoa que escrevia e seu intuito com este blog. Depois de mais de uma centena de postagens de qualidade inconstante, o que se fez foi uma grande apresentação, pois em cada uma delas está o que realmente somos (eu e os que comentam), o que pensamos sobre diversos assuntos, como nos posicionamos diante da vida e que expectativas temos de si.
Então, isto não passará de mais uma apresentação. E espero que este ano continue a ter apresentações agradáveis, tanto da parte concernente a quem escreve como a que lê.