sexta-feira, 6 de março de 2009

Os dias

José Arcadio Buendía foi considerado louco, em Cem Anos de Solidão, por, entre outras coisas, crer que todos os dias eram os mesmos e por isso foi amarrado junto ao pé de uma árvore. Estranho encerrarmos os loucos, separá-los das pessoas "normais", mais estranho é haver loucos e pessoas normais, e mais estranho ainda é haver dias diferentes dos outros. Segundo Foucault, os manicômios e a loucura surgiram quando a sociedade industrial não tinha o que fazer com uma grande massa de pessoas, que dificilmente seriam absorvidas por esta.
E os dias? Por que motivos são diferentes uns dos outros? Não sei. Porém, se fizermos as mesmas coisas todos os dias, sentiremos a sua diferença. Primeiro porque nunca serão as mesmas coisas, senão coisas iguais feitas em outra dimensão temporal, portanto não são as mesmas. Agindo assim, podemos sentir a monotonia de uma rotina, ou a disciplina de uma vida regrada, como queiram. Quando há um feriado, muitas vezes dizemos que parece domingo, e por conseguinte, se o dia posterior ao feriado for uma quarta, passaremos boa parte do dia pensando que é segunda. Interessante é que as 24 horas do dia, definição arredondada que nos dá um dia a mais a cada quatro anos, foram formuladas para termos um calendário e organizarmo-nos em função disso. Porém, os dias na verdade não são diferentes uns dos outros, são sempre os mesmos e conferimos-lhes números distintos no nosso desejo classificatório, e se alguém os faz diferentes somos nós, se pensarmos que todos os dias são iguais, fá-lo-emos iguais. Então creio que soltarei José Arcadio da árvore, pois ele viu muito bem o nosso mundo e dir-lhe-ei que cuide das formigas pra que elas não comam, futuramente, ninguém.

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