sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Sujeitos elétricos

É incrível a necessidade criada por objetos há pouco inexistentes. Lembro-me de que há dez anos pouquíssimos tinham celulares, outro número reduzido de pessoas tinha computadores e menos ainda acesso à internet. De uns anos para cá, essas inovações popularizaram-se e atraíram o foco das comunicações, da produção e da diversão.
Quando contamos a um adolescente uma história passada conosco quando tínhamos a sua idade, surgem questões como: por que não ligamos para o celular? Por que não deixamos um recado pelo Orkut? É-lhes difícil compreender a vida sem essas tecnologias (obviamente que nos referimos a pessoas com condições materiais para usufruir de esses objetos, haja vista, diferentemente, do que muitos pensam, esses meios de comunicação não existem, senão em desejo, para grandíssimo número de pessoas). A questão interessante é que, embora hajamos vivido a maior parte de nossas vidas sem essas tecnologias, hoje, estamos tão dependentes de si que nos encontramos sem saber o que fazer quando, por algum motivo, vemo-nos privados delas. Um celular sem sinal cria-nos a angústia da incomunicabilidade em um caso de emergência, e a nossa vida é um constante caso de emergência. Sem internet ou computador, não poderemos realizar as tarefas, a nós, designadas, perderemos prazos, deixaremos trabalhos inconclusos.
O apagão e os sucessivos apaguinhos, que não atingiram a região onde moro, fizeram as pessoas brincar de séc. XIX, porém automotorizados, por algumas horas, mesmo que, diferentemente, dos sujeitos do século retrasado, soubessem do que estavam a ser privadas. Praticamente, tudo depende da energia elétrica, inclusive nosso comportamento. Não temos condições de executar tarefas de largo porte na ausência da eletricidade. Somos sujeitos que atravessamos a noite como se fosse dia, pois sem a luz do sol, temos a luz da lâmpada. Armazenamos alimentos perecíveis em nossas geladeiras, informamo-nos com a TV, o radia e a internet; divulgamos o que desejamos através desses meios também. Enfim, somos sujeitos elétricos. Sem luz, perdemos, em um primeiro momento, o entretenimento, depois a vida. Assim, que alternativa apontaríamos para comportarmo-nos se nos tirassem essas tecnologias?
Duvidamos que as pessoas leiam à luz de velas, que construam edificações sem energia. Enfim, duvidamos que as pessoas conversem sem basear-se no que lhes é fornecido pelos meios de comunicação. Então, façamos uma reflexão: com energia elétrica, mas sem PC’s, TV’a, rádios, celulares. Nessa situação, nosso comportamento mudaria drasticamente. Começaríamos a ter opiniões “mais próprias”, pois, na ausência da infinidade de informações que nos despejam a cada minuto, teríamos de fazer um exame atento da sobre a vida e nossas posições acerca do que nos rodeia. Debateríamos com argumentos. A moda seria feita por cada um de nós. Os ídolos seriam de outro tipo. Ou tudo seguiria semelhante, porque surgiriam outras formas de massificação do pensamento, inclusive, os jornais poderiam voltar a ter a importância que tiveram outrora. Mas seriam enormes, pois necessitariam de explicar tudo minuciosamente e portarem grande quantidade de gravuras.
Portanto, não há saída. Sempre, criar-se-iam novas alternativas para que a hegemonia se mantivesse. Somos sujeitos elétricos e massificados. Os meios pelos quais somos produzidos têm a grande capacidade de reinventar-se. Mas, paremos um pouco e pensemos sobre a nossa real dependência das coisas. Ser-nos-á tão dificultoso readaptar-nos a uma vida sem tantos instrumentos? Talvez, sim. Pois não vivemos, mas somos vividos.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Construção

O chocante desespero de ver-se sem chão faz-nos raciocinar com dificuldades. Termos planos e vermo-los desfeitos põe-nos a angústia da incerteza no lugar antes ocupado pela esperança na realização de algo futuro. Quando damos por certo o cume de uma torre, e rompe-se uma parte da base, o desalento de que a construção será infeliz apossa-nos. Então, temos três opções: desistir da edificação, reparar o rompido ou desmanchar tudo e recomeçar do zero. Desde já, repudiamos a primeira possibilidade.
Se resolvermos consertar o que está quebrado (e se não quebrado, era uma lacuna necessitada de preenchimento) será mais rápido o caminho. Mas será resistente para agüentar o que vem por cima? E se quando construirmos alguns metros mais, verificarmos que havia outras partes quebradas e/ou outras lacunas? Devermos voltar à base e reparar os estragos para subirmos mais. Contudo, quando nossa torre estiver pronta (se é que algum dia as torres ficam prontas), poderá ser um espetáculo grotesco de peças justapostas, completamente fragmentada e sem representar o todo da obra. Então, perceberemos que gastamos muito tempo em pequenos consertos de nossa edificação e obtivemos um pífio resultado. Além disso, não teríamos mais tempo para implodi-la e recomeça-la pela base.
Pois optemos pela segunda alternativa. Começamos a base e, antes de colocar o tijolo do segundo nível, testemo-la, a fim de constatar sua resistência, ponhamo-la o toda sorte de provas e, constatada a sua eficiência, passemos ao segundo nível. Repitamos, neste nível, os passos do anterior, para aí, sim, partirmos para o nível subseqüente. Parece ser este o método mais eficaz. No entanto, lembremo-nos que tudo reúne aspectos positivos e negativos. Poderemos ser tomados de uma grave ansiedade por vermos a demora de nossa edificação, enquanto as que nos cercam atingem altitudes vertiginosas. Também, poderemos descobrir que toda a acuidade da construção da base de nada nos serviu, pois não percebemos uma lacuna ou a ação do tempo que destruiu um pequeno pedaço que deveremos refazer, haja vista as construções de torres não terem precisão científica.
Portanto, não há verdades sobre construções, e que cada um aja com a sua como melhor lhe prouver. Eu fico com a segunda alternativa, mas isso é uma visão de construção de torres, e nada impede que, em um caso limite, a mudança de método. Destarte, se daqui a algum tempo a forma de edificação mudar, não se espantem, porque mesmo sabendo que as escolhas devem ser convictas, elas não podem ser imutáveis quando se percebo sua ineficácia. Por conseguinte, voltemos atrás quando se faça, extremamente, necessário, porque não poderemos refazer, durante toda a via, nossa construção.

sábado, 21 de novembro de 2009

Já passamos

Nos últimos dias, estão aparecendo pessoas, neste espaço, que antes não o freqüentavam. Junto à satisfação deste "escrevedor", há a noção de como a escrita é poderosa, e a internet capaz de divulgá-la. Quando escrevemos, temos um leitor ideal que compreenderia o texto na sua totalidade, lê-lo-ia com os nossos olhos, aceitando-o ou não. Porém, quando aparecem os leitores reais, tão diversos, de tão diferentes lugares, com opiniões tão distintas, fazem-nos perceber que há quem leia este espaço, embora existam leituras muito, mas muito mais atrativas para se fazer. É interessante notar que os leitores aparecem, comentam, concordam, discordam ,mas, acima de tudo, manifestam-se, porque esse é o objetivo do blog. Então, agradeço-lhes, desde já, a participação em Pensamento Fascinante, pois além de mostrarem que há leitores, estes permitem que vislumbremos o quão claro ou obscuro, no nível de compreensão, é o texto.
Obviamente que, neste espaço, a postagem não seria, somente, satisfação. Comicamente, chama-se este blog de espaço, claro que um espaço virtual também é um tipo de espaço, mas tudo o que está escrito na internet e, apenas na internet, é poderoso como palavra, somente e tão somente, neste suporte. Imaginemos um futuro não muito distante, no qual os e-books (há pessoas que os lêem) substituam os livros, que a escrita seja toda na internet, que não tenhamos materialidade da escrita. Em um futuro mais distante, que o anteriormente mencionado, mas tampouco muito distante, haja uma crise ambiental (engraçado o uso do subjuntivo do verbo haver) e esgotem-se todas as fontes de energia, por conseguinte a internet acabe, os meios de transporte mecânicos tornem-se inúteis, logo os alimentos não chegariam mais às cidades e a maior parte da população mundial não resistiria. Gerações depois, será, praticamente, impossível resgatar os escritos desta época, logo impossível resgatar esta época. Os primitivos tinham a escrita rupestre e daí se pode recuperar noções ddo seu modo de vida e, inclusive, de pensamento dessa época. E nós, que alcançamos um grau inigualável na escala evolutiva, seremos os mais fugazes a termos passado pela Terra. Não seremos conhecidos, não saberão como nos organizávamos e como pensávamos. Ou, talvez, sabê-lo-ão, pois nosso tempo é o do efêmero, existem elementos antiqüíssimos de dois minutos atrás, tudo é passageiro, nada se consolida. Destarte, ao não saberem nada de nós, saberão muito.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Rir da vida

Ver os olhos que nos vêem, quer na frente do espelho, quer nas pupilas dos outros. Encararmo-nos, alguns segundos, e ter de desviar o olhar, pois nos conhecemos bem, ou, pelo menos, melhor que os outros nos conhecem. Saber que temos os defeitos que criticamos nos outros, saber que somos piores do que nos mostramos, saber que isso é a vida, e se não fosse assim, não seria vida. Contudo, será que isso, realmente, é vida ou são pessoas somente? Bem, são as pessoas que organizam o mundo tal qual é, pensado, racionalizado, com suas hierarquias de valores, logo é a vida.
Então, para que ser tão rabugento e pessimista (ou realista), se somos nós que fazemos a vida. Nós que envolvemos e somos envolvidos, nós que despertamos a cobiça e carregamos a ambição, nós que conhecemos tudo quanto conhecemos e não conhecemos nada que não sabemos. Podemos fazer um mundo muito melhor se, para cada um de nós e apenas para cada um de nós, desviarmos o olhar do que nos desagrada, fixarmo-lo no que nos satisfaz. Entretanto, seríamos mais felizes se assim o fizéssemos, sabendo que o estamos fazendo? Isto é, podemos viver felizes e contentes em um sonho pueril, se acreditarmos, de fato, que somos felizes e vivemos em um sonho puerial, mas quando percebemos (não desejo que pareça ser essa a única verdade) que tudo está errado, que tudo é como é, não, simplesmente, porque é assim, senão por uma série de razões e finalidades, então não poderemos seguir desviando o olhar. Nessa senda, se virmos o mundo belo, ele será belo, mas grotesco se assim o contemplarmos. Agora, imaginemos que se temos de desviar o olhar quando nos vemos, o que faremos com o mundo composto por bilhões de olhares desviados?
Mas há um consolo, sempre há um consolo. Refugiemo-nos na ficção factual. Sim, passemos a ignorar o que nos deixa tristes, ou sobrepor os momentos felizes aos do cotidiano. Isso tudo durará alguns segundos, mas na memória durará infinitamente, pois a outra solução é acabar. e essa não é solução. Além do mais, há quem goste das tristezas e de perceber a vida vazia, sem sentido, sem porquê, e vivê-la, sim, porque não viver é fechar os olhos para tudo e desviar os olhos da verdade, de nós mesmos, é perder a opostunidade de desviar os olhos no espelho, e isso sem seria imiscuir-se, definitivamente, na hipocrisia. Se as coisas são como são, como motivo ou não, azar! Apenas, aproveitemo-las. Pois, se a vida ri de nós, riamos dela, ao menos em alguns momentos, de resto, soframos com ela.

sábado, 14 de novembro de 2009

Tudo seguirá igual

Somos os mais importantes do mundo. Sim, somo-lo, porém, apenas, para nós mesmos. Temos toda a nossa existência calcada a partir de nossos olhos, o mundo é o que é para cada um de nós então, como nossas visões nunca serão exatamente iguais, há, aproximadamente, seis bilhões de mundos no mundo. A questão é que, à medida que pessoas vão nascendo e outras morrendo, acontecem dois fenômenos: nasce e morre um mundo e o mundo, como totalidade dos mundos, modifica-se.
O homem julga-se extremamente importante, mas para além de si não importa muito. O que queremos dizer é que a existência é plena, apenas, para cada um, pois ninguém se importará mais com outrem que consigo mesmo, e isso é óbvio e justo. Por mais que sejamos solidários, a solidariedade é uma satisfação pessoal, ninguém é solidário contra a vontade. E se julgamos que ninguém poderá desenvolver nossos afazeres como nós, isso é verdade em partes, porque, somente, nós mesmos podemos fazer o que desejamos da nossa forma, mas a forma do outro é a melhor para si. Julgamos que sentirão nossa falta quando morramos, como nós sentiremos a das pessoas queridas. É verdade, belo veredicto, contudo o mundo continuará quase o mesmo, apenas, sem nós. Os automóveis circularão, as pessoas seguirão com suas vidas e mundo acabará para nós e se renovará com a chegada de outro ser ao mundo que será seu mundo próprio. Ou seja, somos, deveras, apegados a nós, e isso não é um erro, pois não há outra forma de existência, haja vista que, para nós, tudo circula a nossa volta.
Alguns dirão que pensar assim é por demais triste, contudo, creio que é por demais realista percebermos a pequenez de nossa vida, a falta de sentido da existência, o quão pouco e impotente somos. A existência é isto: apenas existir, sem razão, sem motivo, sem ilusão. A vida é vazia e não acreditamos mais na recompensa de uma vida além-túmulo. Trabalharemos, com esforço conquistaremos nossos objetivos, mas de nada nos servirá, a não ser para um deleite efêmero. Então, deixo-lhes um cruel, por ser assaz realista, poema de Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa, que, toda vez que o leio, faz-me pensar sobre isso.

Se te queres matar, por que não te queres matar?
Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,
Se ousasse matar-me, também me mataria...
Ah, se ousares, ousa!
De que te serve o quadro sucessivo das imagens externas
A que chamamos o mundo? A cinematografia das horas representadas
Por atores de convenções e poses determinadas,
O circo policromo do nosso dinamismo sem fím?
De que te serve o teu mundo interior que desconheces?
Talvez, matando-te, o conheças finalmente...
Talvez, acabando, comeces...
E, de qualquer forma, se te cansa seres,
Ah, cansa-te nobremente,
E não cantes, como eu, a vida por bebedeira,
Não saúdes como eu a morte em literatura!


Fazes falta? Ó sombra fútil chamada gente!
Ninguém faz falta; não fazes falta a ninguém...
Sem ti correrá tudo sem ti.
Talvez seja pior para outros existires que matares-te...
Talvez peses mais durando, que deixando de durar...


A mágoa dos outros?... Tens remorso adiantado
De que te chorem?
Descansa: pouco te chorarão...
O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,
Quando não são de coisas nossas,
Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,
Porque é coisa depois da qual nada acontece aos outros...


Primeiro é a angústia, a surpresa da vinda
Do mistério e da falta da tua vida falada...
Depois o horror do caixão visível e material,
E os homens de preto que exercem a profissão de estar ali.
Depois a família a velar, inconsolável e contando anedotas,
Lamentando a pena de teres morrido,
E tu mera causa ocasional daquela carpidação,
Tu verdadeiramente morto, muito mais morto que calculas...
Muito mais morto aqui que calculas,
Mesmo que estejas muito mais vivo além...
Depois a trágica retirada para o jazigo ou a cova,
E depois o princípio da morte da tua memória.
Há primeiro em todos um alívio
Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido...
Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,
E a vida de todos os dias retoma o seu dia...


Depois, lentamente esqueceste.
Só és lembrado em duas datas, aniversariamente:
Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste.
Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
Duas vezes no ano pensam em ti.
Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,
E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.


Encara-te a frio, e encara a frio o que somos...
Se queres matar-te, mata-te...
Não tenhas escrúpulos morais, receios de inteligência! ...
Que escrúpulos ou receios tem a mecânica da vida?


Que escrúpulos químicos tem o impulso que gera
As seivas, e a circulação do sangue, e o amor?


Que memória dos outros tem o ritmo alegre da vida?
Ah, pobre vaidade de carne e osso chamada homem.
Não vês que não tens importância absolutamente nenhuma?


És importante para ti, porque é a ti que te sentes.
És tudo para ti, porque para ti és o universo,
E o próprio universo e os outros
Satélites da tua subjetividade objetiva.
És importante para ti porque só tu és importante para ti.
E se és assim, ó mito, não serão os outros assim?


Tens, como Hamlet, o pavor do desconhecido?
Mas o que é conhecido? O que é que tu conheces,
Para que chames desconhecido a qualquer coisa em especial?


Tens, como Falstaff, o amor gorduroso da vida?
Se assim a amas materialmente, ama-a ainda mais materialmente,
Torna-te parte carnal da terra e das coisas!
Dispersa-te, sistema físico-químico
De células noturnamente conscientes
Pela noturna consciência da inconsciência dos corpos,
Pelo grande cobertor não-cobrindo-nada das aparências,
Pela relva e a erva da proliferação dos seres,
Pela névoa atômica das coisas,
Pelas paredes turbihonantes
Do vácuo dinâmico do mundo...

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Opinião

Hoje, não será usado este espaço para reflexões (ou sim) ou para reclamações da vida, da política partidária, da política educacional, etc. Mas, para esclarecimentos que, talvez, sejam necessários sobre este espaço e o seu porquê.
Este espaço, embora não pareça, funciona como desafogo de uma alma assolada ou, apenas, preocupada com as demandas do mundo que a cerca. O mundo que exige resultados, que exige embasamento teórico para dizer o que se diz, que exige o cumprimento de prazos, que exige a divisão de um em múltiplos para dar conta do que se tem de fazer. Assim, como tenho a incapacidade total para transfigurar em versos essas questões, faço uso da prosa e, destarte, constrói-se um mundo novo, cujos fragmentos não precisam ser aceitos ou rejeitados, senão entendidos. Ver que há diversas óticas que convivem no mundo e não existe uma certa ou uma errada. Este, muitas vezes intolerante para com o que se julga problemas do mundo, é um espaço de tolerância que não pede nada em troca, a não ser que se deixe falar com as amarras mais frouxas, que se deixe contradizer com todo o direito à contradição, que se deixe de lado a hipocrisia da forma mais hipócrita possível, que as opiniões sejam respeitadas, embora a concordância não exista.
Portanto, este é o espaço, por natureza, para dar opiniões, julgar, emitir juízos de valor da forma "mais natural" possível, sem embasamento, sem preocupação, mesmo que a necessidade de responsabilidade com a palavra seja patente, é uma responsabilidade que se volta, unicamente, para a própria palavra e o sujeito que a escreve, para que não se diga o que não se pensa, pelo menos, no momento da escrita. E, finalmente, ainda bem que necessitamos de um espaço como este, pois as demandas do mundo que causam preocupação são, extremamente, positivas; unem-nos com o mundo, fazem-nos ser parte integrante dele e, além disso, instigam-nos a criar um espaço como este.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Chuva de pedras

Chovem pedras sobre nossas cabeças. Após um belo dia de sol interior, como sempre escassos, abatem-se, sobre nós pedras, de mundo real, com seus jogos curéis, postergando o sonho para depois. Mas, estamos vivos, portanto temos de viver, e, por mais que nos refugiemos em nosso interior, somente, conseguiremos jogar um facho de luz à chuva.
O mundo, a existência, a interação dos sujeitos com os objetos podem e, na maioria das vezes, são dolorosas. Refugiar-se é uma alternativa, pois todos queremos proteger-nos, porém, isso, apenas, retarda o intervalo entre uma pedrada e outra. Então, uma opção mais segura (seguindo, de longe, a criação mítica do homem segundo a civilização maia-quiché) seria, ao longo do tempo, construírmos guarda-chuvas de materiais resistentes. Tentemos, para começar, um de madeira. Este pode resistir às primeiras pedras, contudo, rapidamente, cederia. Passariam muitos anos, e depois de diversos intentos frustrados, com diversos materiais, chegaríamos ao guarda-chuva de aço cuja resistência aceitável satisfar-nos-ia, e, embora esse não se rompa diante das mais poderosas tempestades, nas quais após levar uma pedrada na cabeça, recompormo-nos, levaríamos outras tantas, sempre haverá respingo de pedras a nos atingir.
Pensamos que essa é a melhor alternativa, contudo observamos não nos mantermos invulneráveis. Isso é lógico, pois somos seres frágeis! Poderíamos, então, haver construído uma bolha, uma bolha inatacável, seria mais rápido, útil e seguro. Mas, se a construíssemos, nunca seríamos atingidos pelas chuvas de pedras. Bem, podemos perguntar-nos: não era esse o objetivo? Sim e não. Porque, ao passo que, não somos atingidos pelas pedras, também não nos relacionamos com o mundo e, se assim se desse, para que existir? A existência é ataque e defesa, perda e ganho, belo e feio, amor e ódio, e demais antíteses. Existamos, sejamos atingidos, atinjamos também, ou seja, vivamos! Para que um dia, de nós, a chuva de pedras emane.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Jogo do silêncio

Temos optado pelo silêncio. Obviamente, o silêncio tem muito a dizer, pois calar já é dizer que se nega a falar, seja por desgosto, por dor ou por impotência. Porém, nosso prolongado silêncio já está tornando-se angustiante. Esse silêncio de décadas não mais tem algo a dizer, a não ser que é hipócrita. Fingimos, o tempo todo, estarmos em uma situação decente, mas, no âmago de nosso espírito (leia-se parte intelectual, conceito marxista do termo), sabemos a situação de mediocridade na qual estamos a viver.
Estamos a calar, pois já nos habituamos a essa situação. Berramos aos quatro ventos que somos livres e fazemos o que queremos, e não notamos, ou notamos e não damos a devida importância, que estamos engaiolados dentro de um sistema que nos restringe as escolhas, fazendo-nos crer que as temos aos montes. Como diria Eduardo Galeano a única escolha que temos é onde vamos ser enterrados quando morramos. Vivemos em um jogo de faz de conta cuja base é não exigir dos outros para não termos o infortúnio de sermos exigidos e, assim, acovardamo-nos com medo de errar, ser contestados e perceber que não somos perfeitos, algo que já sabemos, entretanto não queremos adimiti-lo a nós mesmos. O problema maior dessa conduta é a imediatez que carrega consigo, ou seja, a articulação da mediocridade prevê um fim prático imediato, então o futuro a ninguém pertence, porque não podemos enganar o tempo todo.
Porém, quando somos pilhados em nossa representação, temos uma saída muito cômoda, não diferente dessa postura, acusamos outrem de incompreensão, insensibilidade mostrando a vítima que somos ou desqualificamo-lo de forma difamatória. Contudo, no momento em que percebemos que somos vítimas, temos o mais importante para reverter essa situação, mas aí vem o confortável silêncio que não nos tira da comidade e segue a forjar uma situação, por nós, idealizada cuja característica principal é sabermos da enganação. Também não vale muito falarmos, apenas, entre os nossos pares que, conosco, concordam, pois isso é silenciar da mesma maneira. E o jogo não termina. Eu minto que me expresso e vocês mentem que dialogam. Assim, todos somos bons, falando de mentira, ou seja, silenciando.