sábado, 5 de dezembro de 2009

Poços secos

Somos poços com água que verte incansavelmente e é extraída para ser bebida por outros. Somos seres cognitivos com idéias expressas através do discurso. Embora a água verta sem descanso, cabe uma pergunta: pode o poço secar?
Em um primeiro olhar, a resposta óbvia é não. Ninguém, salvo uma catástrofe neurológica, parará de pensar, pois estamos sempre pensando mesmo que não o percebamos. O que devemos saber é como se esgotam as ilusórias idéias de estarmos dizendo algo nosso. Ilusórias porque somos um mosaico de referências cuja extensão vai desde a percepção do mundo até como articulamos o que conhecemos, porque, inclusive, quando negamos algo, temos um ponto de contato com algo de outrem (um outrem que pode ser nós mesmos). Esgotadas porque não conseguimos articulá-las e justificá-las como nossas. Não conseguimos dizer nada a respeito de algo.
Muitas vezes, há tanta água que não necessitamos jogar o balde no poço, ela encharca a terra e começa a ser jorrada ao mundo que nos cerca. Contudo, há tempos de escassez. O balde toca no fundo do poço, sente a terra como árida e volta vazio. A água escondeu-se, fugiu-nos. Sabemos que ela existe, porém não a encontramos. Desconhecemos o motivo pelo qual não obtemos a concatenação do que temos em nosso intelecto. Nada nos desperta o interesse para que articulemos idéias e exponhamo-las, pois o pouco senso crítico de que desfrutamos está abalado. Sim, porque termos a ilusão de sermos os donos de uma idéia, de termos opinião própria que pode ser compartilhada por outros, não é mais do que tomarmos um objeto, entenda-se este como um fato, uma lembrança ou algo material, e refletirmos, confrontarmo-lo com o que já está internalizado, para descrevê-lo, concordar ou discordar com ele. Assim, provavelmente, não temos uma crise de criatividade, senão de senso crítico.
Enfim, esses fatos ocorrem, muitas vezes, em nossa vida, mas problema é que eles nos assustam. A angústia de sentir-se seco por dentro, desertos esperando por água, poços aguardando infiltração, aterroriza-nos e faz-nos pensar que não seremos molhados outra vez.

6 comentários:

Anônimo disse...

Amado meu,

Este lindo texto me levou a Nietsche , para ele , somos todos muito cegos, não usamos a imaginação, nos pautamos em poucas coisas ,apenas no plausível, ou seja, estamos de encontro ao niilismo.Nada tenho mais a acrescentar ,somente meus beijos e parabéns !

Fyllos,

uma poetinha... disse...

armazenando água interna...vou?!?...
=/

Desmanche de Celebridades disse...

Simplesmente Fantástico!
Vivemos tempos mediocres do ponto de vista da inovação.
Sobram inovaçoes técnicas e faltam inovações de ideias.
Ja tive essa impressão, a impressão de ser apenas um mosaico de ideias sem nada a crescentar.

Abraços.

εϊз Anne Cris εϊз disse...

Aproveitando o momento que me dei para a leitura do teu blog, quero dizer que estão lindas as tuas reflexões, teus pensamentos e tuas idéias.
Sempre me coloco a pensar em tudo que tu escreve e sempre me surpreendo com a sensibilidade das palavras, que na maioria das vezes me tocam profundamente.
Faltando exatamente 1 MÊS para teu blog completar 1 ano de idade, deixo aqui os meus parabéns e desde já desejo muito + sensibilidade e sucesso com as tuas palavras e pensamentos.
Com amor...

Rodrigo Bentancurt disse...

É isso aí, pesoal. Vamos expor nossas idéias da forma que vierem. Obrigado a todos

Diego Cosmo disse...

caçar as coisas, despertar em si mesmo a curiosidade acho q deva ser o remédio!