Chego a conclusão que os espanhóis conheceram o francês René Descartes (1596-1650) muito melhor que os portugueses. Quando se anda por cidades hispânicas, percebe-se a organização urbana desses lugares, quadras, realmente, quadradas, planos arquitetônicos bem distribuídos, ou seja, lugares nos quais as pessoas conseguem andar tranqüilamente mesmo sem conhecê-los. Uma praça central cujos pontos ao redor são a igreja, a administração pública e casarões da época da colonização. Obviamente, o filósofo e matemático francês é posterior à incipiente colonização, embora o período de urbanização das colônias é contemporâneo ao erudito francês. A urbanização cartesiana chega ao cúmulo de na Argentina as áreas cêntricas terem um ponto zero de onde partem todas as demais ruas com numeração crescente de Norte a Sul, de Leste a Oeste, ninguém alfabetizado, por mais esforço que faça, conseguirá perder-se. Já a herança urbanística portuguesa é muito simples, cresça como puder, como der, vão fazendo uma casa atrás da outra e azar, se chover e desabar a defesa civil pede doações. Essa herança foi muito bem internalizada por nós que seguimos com o mesmo plano arquitetônico de nossos centros urbanos.
A questão é que o plano urbano é apenas uma amostra superficial muito visível da desorganização que herdamos, e que os portugueses atribuem aos índios, pois se algo herdamos destes foi a higiene. Assim, somos assistemáticos nos planos escolares, no respeito que dispensamos aos outros, nos pedidos de desculpas que damos por nossas irresponsabilidades. E assim, seguimos sem conhecer Descartes.