sábado, 10 de dezembro de 2011

Lençol

Há uns dez anos, eventualmente, minha mãe me pedia para realizar a tarefa mais abominável para a maioria dos adolescentes: arrumar a cama. Fastio imenso. Então, ia minha mãe revistar o trabalho e dizia: “Mas, Rodrigo...” com esse costume de linguagem que ela tem: começa as frases com uma adversativa, mostrando que a distância entre o raciocínio e a enunciação era longa. Isto é, ela já havia pensado algo anteriormente e, quando se deu o ato de enunciação, a outra coordenada tinha sido escamoteada. Dizia ela: “Mas, Rodrigo, esse lençol está do avesso!”, mas por quê? – perguntava eu, mostrando a herança linguísitca – “Porque a estampa não está para cima”. Claro, isso era lógico. Lógico? Não, apenas uma convenção. Eu colocava o lado da costura para dentro, logo, meus padrões não eram estéticos; minha mãe diferia de mim, mas acompanhava a maioria. A aparente futilidade das conversas caseiras nos esconde pequenas pistas desta coisa “organizada”, “plena”, “estanque” e “natural” que é o mundo. Na verdade, certo estava Borges: “Nosotros hemos soñado el mundo. Lo hemos soñado resistente, misterioso, visible, ubicuo en el espacio y firme en el tiempo; pero hemos consentido en su arquitectura tenues y eternos intersticios de sinrazón para saber que es falso.”